A primeira vez que estive em Berlim foi aos 17 anos, fazendo um mochilão com as minhas melhores amigas. Fizemos o clássico roteiro turístico, voltado para a história da capital alemã. Lembro de ficar muito abalada quando visitei o Checkpoint Charlie e o Memorial do Holocausto, e de sair inspirada do Museu do Bauhaus e da Hamburger Bahnhof. Foram muitas informações e novas referências, em uma cidade onde a dor do passado parecia coexistir com a ousadia do presente, numa simbiose muito particular.
Alguns anos depois, aproveitei que morava “ao lado” (na Escócia), para conhecer os festivais de música eletrônica e clubs de techno emblemáticos de Berlim. Íamos em bando, com amigos dos quatro cantos do mundo. Nessas ocasiões, os dias não começavam antes das duas da tarde, quando nos levantávamos para comer algum fast food e, devidamente abastecidos, recomeçávamos a maratona de dança nas pistas da cidade. A cena eletrônica de Berlim é algo que todo mundo deveria experienciar, ao menos uma vez na vida, como uma verdadeira aula de desprendimento.
Dessa vez, voltei para correr uma maratona, e para viver a Berlim da
. Depois de ler tanto sobre os listening bars, os supermercados orgânicos e os restaurantes zero waste na , sabia que estava na hora de retornar, e conhecer uma nova camada da cidade.Nestes breves parágrafos, citei algumas facetas de Berlim: a da história, da arquitetura, da música eletrônica, do esporte, dos bares e da cozinha sustentável. Há muitas outras e, o mais legal, é que todas elas existem ao mesmo tempo. Na véspera da prova, pedi para algumas pessoas informações sobre a maratona, e elas nem sabiam que o evento iria acontecer, mesmo ele movimentando milhares de pessoas. Eu amei aquilo; pensar que uma cidade é tão grande, e tem tantas possibilidades, que existem diversas coisas acontecendo concomitantemente.
Refletindo agora, talvez seja por isso que eu goste tanto de Berlim; é uma cidade que são várias. E mais, sinto que por preconceito, ela não recebe a mesma atenção que outras grandes capitais europeias, e isso me faz querê-la ainda mais. Sejam eles lugares ou pessoas, adoro rebeldes, e Berlim é a resistência em forma de cidade.
Com amor,
Paula
Lalai ♥️
Hoje no Instagram da NAZA, contei um pouco sobre o presente que foi conhecer a Lalai, graças a este espaço. Moradora de Berlim, ela representa o que a cidade tem de mais legal e, o melhor de tudo, é que ela tem uma newsletter só com dicas de Berlim. Além disso, através da Orbita, ela organiza roteiros muito especiais para marcas que buscam viver experiências fora da caixa na capital alemã. Com isso, a minha melhor dica de Berlim é uma, e ela se chama Lalai. Tive a sorte de poder entrevista-lá, e divido aqui com vocês a nossa conversa. Danke Lalai 🖤
1. Qual é a história por trás do seu nome?
O meu nome real é Elaine. Lalai nasceu na internet, no universo dos blogs. Eu tinha um amigo virtual, que virou um amigo real, que é cartunista. Ele criou uma personagem-musa chamada Fernanda Breta no começo dos anos 2000, e eu acabei virando uma personagem de quadrinhos amiga dela (o cartunista é o André Leal). Ele me chamava de "Lalai" e, quando fiz meu primeiro blog, dei o nome de Lalai em homenagem a ele. Na época em que os blogs surgiram, a gente fazia muitos encontros de blogueiros, e acabávamos chamando as pessoas pelos nomes dos blogs. E, assim, virei Lalai, que ficou maior que a Elaine.
2. O que a Orbita faz?
A Orbita é uma consultoria criativa fundada por amigos em São Paulo, para conectar pessoas e marcas, através da música, arte e cultura. A ideia é trabalhar em rede, sem uma estrutura fixa. Plugamos os profissionais de acordo com os projetos que temos em mãos.
No ano passado, decidi criar um braço em Berlim para facilitar a comunicação. Ultimamente, tenho sentido a Órbita Berlim como um negócio fluído, em que diferentes tipos de projetos podem ser feitos. Até porque, no fim das contas a Órbita Berlim sou eu "orbitando" projetos distintos, desde estratégia criativa de comunicação digital, até criação de experiências, para marcas que desejam se conectar com o universo da música e da arte.
3. Vocês também criam roteiros para quem quiser explorar Berlim?
Desenhamos experiências para marcas e pessoas que fazem viagens de inovação em busca de referências e insights, e que querem entender novos movimentos. Gosto muito desse lugar; de como encontrar na capital alemã novos lugares e olhares para serem explorados, de uma maneira que possa contribuir para criar não apenas novos produtos e serviços, mas também para impulsionar grandes marcas a discutirem assuntos urgentes, que no Brasil ainda são tímidos.
4. Porque você escolheu morar em Berlim?
Pisei em Berlim pela primeira vez num outono muito gelado em 1997, e a cidade era um grande canteiro de obras. Mesmo assim, me apaixonei por ela e prometi que voltaria, o que só aconteceu dez anos depois. Deparei-me com uma cidade muito diferente, ainda mais vibrante, e ainda causando uma sensação única de liberdade, que me foi tão presente na primeira viagem. Desde então, passei a visitar Berlim anualmente.
Em 2019, devido à situação política do Brasil, eu e o meu marido começamos a cogitar a dar um tempo do país. Começamos a listar as cidades que gostaríamos de morar. Eu tinha um desejo antigo de morar aqui, mas somos dois e teríamos que entrar num acordo. Analisamos o mercado - em especial o dele, que é o de tecnologia - e acabamos percebendo muitas oportunidades profissionais em Berlim, já que a cidade está vivendo um boom de startups. Juntamos isso ao fato de ser uma cidade mais relaxada, com um custo de vida inferior ao das grandes capitais europeias, e eu já ter amigos na cidade. Batemos o martelo e, em três meses, alugamos um apartamento e o Ola estava empregado (inclusive com a empresa cuidando de toda a burocracia do meu visto e da mudança). Tivemos muita sorte em conseguir um apartamento tão logo, porque esse é o maior obstáculo de quem quer morar em Berlim. Então, por que não?
5. Qual dica você daria para alguém visitando Berlim pela primeira vez?
Esta é uma pergunta difícil, porque Berlim são várias Berlim, então depende muito do perfil de quem a visita. De qualquer maneira, a história do muro permeia a cidade até hoje, e é interessante entender como ele impactou bastante no que a cidade é atualmente. Gosto muito do Memorial do Muro, que é perto de casa, e dá para ter um bom panorama sobre o que rolou no período em que ele existiu. Nele, é possível ver de cima como funcionava o muro - que eram dois na verdade - a partir de um terraço no topo do Centro de Documentação. Gosto mais dessa área do que o East Side Gallery, que é mais famoso.
Falando em vistas, Berlim é uma cidade plana, e são poucos os lugares que permitem vê-la de cima. Um deles é a Torre de TV. Apesar de ser um dos principais pontos turísticos, eu adorei a experiência de jantar no topo dela, que fica girando e permite ver Berlim 360º.
Além disso, indico visitar o Hamburger Bahnhof, o museu de arte contemporânea que ocupa a antiga estação central da cidade, e o Tempelhofer Feld, um aeroporto desativado que virou um dos principais parques de Berlim. E, se tiver oportunidade, recomendo fazer um tour de barco pelo Rio Spree, que dá uma visão bem ampla da cidade a partir da água. Se sobrar tempo, sugiro pegar o ônibus linha 100 em Alexanderplatz e ir até o ponto final. É lá, no bairro de Charlotemburgo, onde se encontra a Igreja do Kaiser Wilhelm, que foi quase toda destruída na guerra. Sua torre foi mantida quebrada, mesmo depois de ter sido reformada. É interessante como os símbolos das coisas ruins que aconteceram em Berlim se mantém vivos, para que essas histórias não sejam esquecidas e repetidas.
Por fim, caso esteja em um domingo na cidade, o Mauerpark é sempre uma atração. Com seu karaokê ao vivo e diversos shows espalhados ao longo do parque, o programa pode ser divertido. O seu mercado de pulgas é um dos maiores que temos por aqui. Ah, e não deixe de comer em um dos diversos restaurantes vietnamitas, e experimentar um kebab (lembrando que Berlim é um paraíso para vegetarianos e veganos).
6. E para quem que já foi algumas vezes?
Vale muito explorar Kreuzberg e pedalar pelo Tempelhofer Feld, emendando em um passeio pelo bairro de Neukölln. Lá, recomendo jantar em um dos diversos restaurantes bons que tem no bairro (eu gosto muito do Holly Gastrobar e do Beuster), ver um show de jazz no Donau115, e terminar a noite no Arkaoda, que costuma ter boas festas no basement. Apesar de ter ficado turístico, gosto muito de ver o pôr do sol do Klunkerkranich, um bar escondido no topo de um shopping center, também em Neukölln.
Em dias ensolarados, gosto de caminhar pelo canal em Kreuzberg, visitar a feira de rua na Maybachufer, que acontece às terças e sextas-feiras, pegar uma comida numa das barracas e comer sentada à beira da água. Nesta região tem o La Maison, um café concorrido frequentado por locais que serve sanduíches, vinho natural e comidinhas, e o Sway, conhecido pelo queijo quente. Visitar a UY, que eu acho uma das marcas de roupa que mais tem a cara de Berlim, a Ryoko Senses Salon, uma loja que só abre às sextas e sábados no período da tarde, e a She Said, uma livraria dedicada à literatura escrita por mulheres. Essa região tem muitos bares e restaurantes bons. Eu, que adoro um listening bar, recomendo o Umkompress, que fica escondido numa charmosa rua pertinho do canal. Para jantar, indico o Buya, que serve um lámen delicioso. Uma das lojas mais legais de Berlim é a Modulor, que vende tudo que você possa imaginar para quem gosta de trabalhos manuais.
Além disso, vir a Berlim e não visitar a Berlinische Galerie, o Gropius Bau, a Neue Nationalgalerie e o Hamburger Bahnhof, meus museus favoritos da cidade, todos dedicados à arte moderna e contemporânea, é um pecado. E quem ama fotografia não deve deixar a C/O Berlin de fora da programação.
Para amantes de revistas, a Rosa Wolf, pertinho do Mauerpark, é o paraíso. A Do You Read Me?, na Augustrasse onde tem a KW, um instituto de artes com um ótimo café, que também vale. Eu, que sou apaixonada por livros, indico também nessa área a About Bookshop, que vende livros baseados em temas por temporada. Uma das minhas galerias favoritas, a Sprüth Magers, fica próximo dali.
Caso tenha um pouco mais de tempo, assista um filme em um dos cinemas de ruas de Berlim. Aqui tem uma cultura muito forte de cinema. Eu gosto muito do Kino International, na Karl Marx Allee, pela sua magnitude arquitetônica. Mesmo que não vá ao cinema, vale visitar o café no primeiro andar; é soberbo.
Se tiver algum show previsto, a Funkhaus, onde funcionou a rádio da Alemanha Oriental, tem um dos palcos mais impressionantes de Berlim. O Silent Green, um antigo crematório, também é bem legal. E eu adoro ir na Berghain no domingo a tarde :) E, claro, se for passar um fim de semana em Berlim, não deixe de conferir meu guia, o The Next Day. :)
Por fim, o verão está indo embora, mas durante esta época do ano dois programas são imperdíveis: passar pelo menos uma tarde num lago, e visitar uma das piscinas públicas de Berlim. Se tiver tempo, pegue um trem até Schlachtensee, que tem um dos lagos mais bonitos próximos da cidade, para um passeio na sua margem. No caminho, faça um pit stop no biergarten que tem por lá. E, se a nudez não for um problema para você, o Vabali é o spa favorito de quem mora aqui. Só é permitido usar roupão, e o celular fica trancado no armário.
7. Tem algum livro passado em Berlim que você recomenda?
Um Brasileiro em Berlim, do João Ubaldo Ribeiro, que traduziu muito bem o dia a dia de quem imigra para cá. Também indico Walking in Berlin, de Franz Hessel, publicado em 1929.
8. O que você faz para relaxar?
Eu gosto muito de passear pelas florestinhas, e de pegar minha canga e meu livro e ir para alguma pra praça perto de casa. Quando tenho mais tempo, gosto de pedalar no Treptower Park, um dos meus parques favoritos de Berlim, e no Tiergarten. Prefiro o primeiro por ficar à beira do rio, e porque ele tem um ótimo biergarten, o Zenner, que tem sempre uma boa programação musical durante o período em que funciona (no inverno fecha). O Treptower também esconde um lago e um monumento magnífico, o Memorial de Guerra Soviético, além de ter uma floresta por onde eu adoro pedalar no outono, a Planterwald, onde por muito tempo teve um parque de diversões abandonados que dava ares de filme de terror em dias mais cinzas.
9. Qual é a sua época do ano favorita em Berlim?
Só não sou fã do inverno porque os dias são muito curtos. Gosto particularmente do outono, especialmente da época de floração, em que a cidade fica cor-de-laranja, amarela e vermelha. Linda de morrer, ótima para pedalar, o céu azul da cor mais bonita, e a temperatura agradável.
10. Qual é a sua palavra favorita em alemão?
“Genau”. Gosto da sonoridade e da simplicidade dela. Significa "exatamente". As pessoas falam "genau" o tempo todo quando conversam, assim como nós falamos "certo" ou "concordo". O idioma todo é muito rico, e tem muitas expressões com significados muito especiais, como o famoso "Zeitgeist", o espírito do tempo, e “Waldeinsamkeit”, uma expressão para traduzir a sensação de solidão ou isolamento agradável que experimentamos quando estamos sozinhos numa floresta, ou em meio à natureza.
11. O que você mais desgosta da cultura alemã?
A falta de jogo de cintura. Improvisar é algo praticamente inexistente, e a espontaneidade é tolhida. Tudo é preciso planejar com muita antecedência, nada é marcado em cima da hora. Acho tudo isso rígido demais.
12. Você sempre gostou de música?
Sim, a música é o que me move. Mas, curiosamente, eu raramente trabalho ouvindo música. Gosto muito do silêncio, pois quando ouço música, gosto de prestar atenção nela. Antes de me mudar para Berlim, eu sempre estava de fone na rua, mas aqui aprendi a apreciar os sons da rua, então uso menos o fone de ouvido. Adoro ir para o lago com a minha caixa de som portátil, algo que não soaria bem no Brasil, mas que é comum aqui (tem gente que tem caixa de som até acoplada na bike!). E, claro, amo música ao vivo; é algo que me emociona e me nutre. Estou neste momento me recuperando de um show lindíssimo, do Jeff Mills acompanhado por uma banda.
13. Você tem uma música favorita?
Não tenho uma música favorita, pois depende muito do meu humor e fase da vida. Em casa, adoro ouvir música Clássica Contemporânea, Dub Techno, EBM, Indie Rock e Pop. Em dias que preciso dar um UP no astral, busco sorrisos na Jessie Ware, na Roísín Murphy, ou no Yeah Yeah Yeahs! Quando quero me inspirar, procuro a PJ Harvey.
14. O que não pode faltar na sua mala de viagem?
Fones de ouvido, um bom hidratante para as mãos e o kindle. A cada viagem, levo menos coisas.
11 Cantos Especiais em Prenzlauer Berg
Se você achou que a Lalai economizou nas dicas rsrs, fizemos um post com 11 lugares especiais no bairro dela. Testamos e aprovamos muito todas elas.
Amei estar por aqui. Obrigada ❤️
E agora to eu aqui vendo passagem pra Berlim 🤩👏👏👏