Estou vivendo um momento peculiar com a escrita. Tenho me percebido muito criativa, mas sinto que não tenho a capacidade técnica de pôr em palavras aquilo que eu gostaria de expressar.
Quero escrever sobre a frustração que sinto toda vez que tento acessar o parque Ibirapuera enquanto pedestre, mas quando vejo, esse sentimento foi reduzido à um pequeno rodapé na edição paga desta newsletter. Paradoxalmente, tenho vontade de formular páginas inteiras sobre o meu amor por São Paulo, mas o que sai é um post acanhado no Instagram. Cheguei a escrever textos enormes sobre como estou amando essa fase tão criativa, mas o que se concretizou foi uma frase sobre o porquê amo a palavra “espaço”, que provavelmente será deletada antes de alguém ler.
No passado, esse seria o momento perfeito para a síndrome da impostora tomar conta de mim. Já até sei o que ela falaria: “você não tem formação para escrever”, “cadê o mestrado em Letras?”, "olha o tanto de erro que tem neste texto”, e por aí vai. Mas, pela primeira vez, essa voz está quase inaudível.
À medida que o tempo passa, fica cada vez mais claro para mim como o importante é colocar a nossa criatividade para fora, independente do produto final estar certo ou errado (até porque, isso é quase que totalmente relativo).
Pinte o seu quadro, escreva o seu texto, desenhe o seu sonho; é para você e, se o outro achar bom, isso é um bônus.
Com amor,
Paula
Vamos Comprar um Poeta de Afonso Cruz 📚
Sei exatamente de onde está vindo esse sentimento de “insuficiência técnica” na hora de escrever. Tenho lido livros tão bons, que a barra tem ficado cada vez mais alta.
Primeiro foi Se Deus Me Chamar Não Vou, que virou imediatamente o livro que eu gostaria de ter escrito. Depois engatei em O Parque das Irmãs Magnificas, e em Maud Martha, de Gwendolyn Brooks. Por fim, foi a vez de Vamos Comprar um Poeta, obra genial do artista multidisciplinar português Afonso Cruz.
Com menos de 90 páginas, o livro é daqueles que pede para ser devorado em uma sentada. Mas não recomendo ler tão rápido assim; são tantas as metáforas profundas, que precisei ler e reler para entender o real significado delas.
No livro, Cruz faz uma ótima crítica a sociedade atual, e a tendência que temos de atribuir utilidade às coisas, desprezando aquilo que não conseguimos visualizar como um ganho palpável. Caiu como uma luva depois da newsletter da semana passada, em que falei sobre a questão do descanso, em contraposto aos entregáveis.
A obra é extremamente poética, literalmente. Deixo aqui um trecho do apêndice, que é tão bom quanto o livro em si:
A ficção e a cultura constroem tudo o que somos. Não nascemos com pelos e dentes afiados e garras. Criamos roupas e ferramentas, que são sempre produto da ficção, da cultura. A verdade salva-nos, por motivos evidentes, mas a ficção também.

Maria Stockler Carvalhosa e Supersônica 🎧
Hoje em dia, livros não necessariamente precisam ser lidos; eles também podem ser ouvidos. Por mais que os audiolivros ainda sejam pouco comuns no Brasil, eles são um fenômeno lá fora.
Neste podcast da revista Gama, descobri que a Maria Stockler Carvalhosa lançou recentemente a editora Supersônica, que pretende preencher a lacuna que existe no universo dos audiolivros em português. A ideia é tratar a leitura como um projeto artístico, proporcionando uma experiência que mobiliza sentidos e emoções.
Para fazer isso, a Supersônica une grandes títulos da literatura, sejam clássicos ou contemporâneos, a grandes vozes da cultura brasileira. Por exemplo, no episódio do podcast, ouvi um trecho de As Mulheres de Tijucopapo, clássico da literatura brasileira de Marilene Felinto, narrado pela MC Roberta Estrela D’Alva. Adorei o que escutei.

Quero maiZ: Para quem não sabe, a Maria tem uma história incrível, que descobri através do episódio Maria & Café no podcast da Rádio Novelo. Durante quase uma hora, acompanhamos a jornada dela, que perdeu a visão aos 13 anos por conta de um erro médico, ao encontro de seu cão guia. É um relato sensível e muito comovente.

Maria Nepomuceno no Instituto Artium 🎨
Além de mergulhar nas leituras, aproveitei o feriado em São Paulo para visitar uma série de exposições. Usei a Agenda da NAZA para escolher os programas, e não é que funcionou rsrs?
Comecei pelo Auroras, em que está o trabalho da pintora americana Amy Sillman, e depois fui na Casa Domschke, onde acontece a segunda edição da Aberto. No dia seguinte, fui visitar a exposição da Maria Nepomuceno no Instituto Artium de Cultura.
Situado em frente à Praça Buenos Aires, o Instituto ocupa o Palacete Stahl, que tem uma história bastante particular. Durante quatro décadas, a casa funcionou como sede do governo japonês. Em 1980, ela foi desocupada, e passou anos abandonada. Em 2007, uma compradora anônima adquiriu o imóvel, e fez uma reforma extensa. Desde 2020, o casarão é alugado pelo instituto.

No momento, está em cartaz a exposição Big Bang Boca, em que a artista carioca Maria Nepomuceno ocupou os salões principais da casa com suas obras de texturas inusitadas e coloridas. Foi um sopro de energia boa perambular por esses trabalhos tão divertidos e alegres.
Instagram da NAZA 🍸
Seguimos a todo vapor com a série de posts no Instagram da NAZA. Essa semana fizemos um indicando 11 Bares Abertos em 2023, outro escolhendo 11 (Jovens) Clássicos na Vila Buarque, e este, que contém uma pequena declaração de amor para a cidade que aprendi a amar. Tintin.
Arado, Daily Stoic e Gama 📱
Já que estamos falando de Instagram, vou deixar a recomendação de três posts que curti essa semana.
Primeiro, este do Estúdio Arado, que faz um excelente trabalho de pesquisa e divulgação do imaginário rural brasileiro. Adorei esse último cartaz deles, gravado pelo artista gráfico caipira Luis Matuo.

Depois, o Daily Stoic, que aplica o estoicismo no dia-a-dia de forma original e inteligente. Tem muita sabedoria no post dessa segunda-feira, em memória às vitimas do 9/11. Recomendo para todos, principalmente para quem já viveu um luto.
Por fim, adoro o trabalho do Fernando Luna para a revista Gama. Toda segunda, ele apresenta sua “Antologia Profética”, com “versos desgraçadamente atuais”. Vale ler o texto do post, depois de apreciar a beleza dessa frase.